A responsabilidade quanto ao pagamento de tributos está prevista no artigo 34 do CTN, sendo que o ente municipal tem a faculdade de eleger o sujeito passivo do tributo do IPTU para facilitar o seu procedimento de arrecadação (súmula 399 STJ [1]).
Diante desse entendimento, precisamos verificar se a instituição financeira, na qualidade de credora fiduciante, enquadra-se em alguma das hipóteses previstas em lei. Nesse artigo mostro quais são essas hipóteses.
A alienação fiduciária é uma garantia frequentemente utilizada no mercado imobiliário em situações que o comprador não possui condições financeiras para arcar com o pagamento à vista do imóvel ou prefere não investir toda a sua reserva financeira em um único bem.
Com isso, surge o primeiro questionamento: Qual é a intenção do Banco com a alienação fiduciária?
Essa questão foi enfrentada pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ):
“a intenção do devedor fiduciante, ao oferecer o imóvel como garantia ao contrato de alienação fiduciária, não é, ao fim e ao cabo, transferir para o credor fiduciário a propriedade plena do bem, diversamente do que ocorre na compra e venda, mas apenas garantir o adimplemento do contrato de financiamento a que se vincula, objetivando que, mediante o pagamento integral da dívida, a propriedade plena do bem seja restituída ao seu patrimônio” ( REsp 1.726.733/SP, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, Terceira Turma, julgado em 13/10/2020, DJe 16/10/2020).
Dando sequência ao estudo, o que acontece com o imóvel caso o comprador (devedor fiduciante) deixe de pagar as parcelas do financiamento?
Com o inadimplemento do devedor, opera-se a chamada consolidação da propriedade em nome do banco (credor fiduciário) (art. 26, §§, da Lei n. 9.514/1997) e a posterior alienação do bem a um terceiro, pois a legislação não permite que o banco permaneça como proprietário do imóvel (art. 27 da Lei n. 9.514/1997 e art. 1.364 do CC/2002).
Logo, isso quer dizer que o banco não tem responsabilidade sobre o imóvel?
Para responder essa pergunta vamos precisar analisar dois artigos da legislação:
Lei nº 9.514/1997 – Art. 27 § 8º – Responde o fiduciante pelo pagamento dos impostos, taxas, contribuições condominiais e quaisquer outros encargos que recaiam ou venham a recair sobre o imóvel, cuja posse tenha sido transferida para o fiduciário, nos termos deste artigo, até a data em que o fiduciário vier a ser imitido na posse.
Código Civil – Art. 1.368-B. A alienação fiduciária em garantia de bem móvel ou imóvel confere direito real de aquisição ao fiduciante, seu cessionário ou sucessor.
Parágrafo único. O credor fiduciário que se tornar proprietário pleno do bem, por efeito de realização da garantia, mediante consolidação da propriedade, adjudicação, dação ou outra forma pela qual lhe tenha sido transmitida a propriedade plena, passa a responder pelo pagamento dos tributos sobre a propriedade e a posse, taxas, despesas condominiais e quaisquer outros encargos, tributários ou não, incidentes sobre o bem objeto da garantia, a partir da data em que vier a ser imitido na posse direta do bem. [Grifei]
Diante desse cenário, podemos concluir alguns pontos sobre a figura do banco, na condição de credor fiduciário:
1. O banco não é detentor do domínio útil sobre o imóvel (o devedor que tem esse domínio);
2. O banco tem a posse indireta do imóvel, mas não possui animus domini. Em outras palavras, não tem a vontade de ter o bem como se seu fosse; e
3. O banco torna-se proprietário do imóvel mediante o processo da consolidação da propriedade, porém não pode usufruir dos poderes de domínio/propriedade (uso, gozo e disposição), por expressa vedação legal.
Com isso, considerando a regra do Código Tributário Nacional ( CTN), o banco pode ser responsabilizado pelo pagamento do IPTU do imóvel objeto da garantia fiduciária?
Essa questão foi discutida pelo Superior Tribunal de Justiça, no AREsp nº 1.796.224 – SP (2020/0312851-7).
TRIBUTÁRIO. IPTU. SUJEITO PASSIVO. IMÓVEL OBJETO DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. CREDOR. RESPONSABILIDADE ANTES DA CONSOLIDAÇÃO DA PROPRIEDADE. IMPOSSIBILIDADE.
1. O Superior Tribunal de Justiça, em julgamento submetido ao rito dos recursos especiais repetitivos, consolidou o entendimento de que cabe ao legislador municipal eleger o sujeito passivo do IPTU, entre as opções previstas no CTN.
2. A jurisprudência desta Corte, interpretando o art. 34 do CTN, também orienta não ser possível a sujeição passiva ao referido imposto do proprietário despido dos poderes de propriedade, daquele que não detém o domínio útil sobre o imóvel ou do possuidor sem ânimo de domínio.
3. O credor fiduciário, antes da consolidação da propriedade e da imissão na posse no imóvel objeto da alienação fiduciária, não pode ser considerado sujeito passivo do IPTU, uma vez que não se enquadra em nenhuma das hipóteses previstas no art. 34 do CTN.
4. Agravo conhecido e provido o recurso especial. [Grifei]
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