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Procuração na compra e venda de imóvel: O que você precisa saber?

A legislação brasileira permite que negócios jurídicos sejam celebrados por meio de procuradores, ou seja, terceiros que representam a vontade de, pelo menos, uma das partes do contrato, não sendo diferente na venda e compra de um imóvel.

Esses procuradores recebem poderes para praticar atos ou administrar interesses, em nome da pessoa que outorgou a procuração (mandante), podendo ser constituídos através de instrumentos particulares, feito pelo próprio usuário, ou por instrumento público (procuração pública), feito somente em cartório.

Ocorre que a transação imobiliária exige o cumprimento de algumas formalidades, inclusive com relação a procuração, a ser utilizada pelas partes durante a negociação do imóvel.

I – Poderes expressos e especiais

Primeiramente, a procuração, em termos gerais, só confere poderes para a administração de bens do mandante:

Código Civil – Art. 661. O mandato em termos gerais só confere poderes de administração.

Dessa forma, para que sejam outorgados poderes hábeis a viabilizar a disposição, alienação ou gravação do patrimônio do mandante, exige-se a confecção de instrumento de procuração com poderes expressos e especiaispara tanto:

Código Civil – Art. 661 § 1º Para alienar, hipotecar, transigir, ou praticar outros quaisquer atos que exorbitem da administração ordinária, depende a procuração de poderes especiais e expressos.

De acordo com a Ministra Nancy Andrighi, no julgamento do Recurso Especial nº 1.836.584 – MG (2019/0266544-2), “os poderes expressos identificam, de forma explícita (não implícita ou tácita), exatamente qual o poder conferido (por exemplo, o poder de vender). Já os poderes serão especiais quando determinados, particularizados, individualizados os negócios para os quais se faz a outorga (por exemplo, o poder de vender tal ou qual imóvel).

I.1 – Extrapolação dos poderes outorgados na procuração

A legislação brasileira tem a finalidade de proteger o outorgante contra eventuais prejuízos causados por ato praticado em seu nome, mas sem o seu consentimento, pelo mandatário que extrapola o limite dos poderes que lhe foram concedidos por mandato.

Com isso, depreende-se que os atos praticados por quem não tenha poderes suficientes para tanto, ou ainda por quem excede os poderes do mandato ou procede contra eles, são ineficazes em relação ao mandante:

Código Civil – Art. 662 Os atos praticados por quem não tenha mandato, ou o tenha sem poderes suficientes, são ineficazes em relação àquele em cujo nome foram praticados, salvo se este os ratificar.

Art. 665. O mandatário que exceder os poderes do mandato, ou proceder contra eles, será considerado mero gestor de negócios, enquanto o mandante lhe não ratificar os atos.

II – Instrumento Público

Em atenção ao princípio da simetria das formas ( Código Civil, artigo 657), os atos que visem a constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis de valor superior a 30 (trinta) vezes o maior salário mínimo do país exigem procuração por instrumento público.

Esse foi o entendimento da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), no julgamento do AgInt no REsp 1894758 (2020/0151344-8 de 15/12/2021), por maioria, que anulou uma transferência de imóvel posterior ao falecimento da proprietária, em razão de ter sido realizada por meio de procuração particular.

artigo 108 do Código Civil estabelece que, “não dispondo a lei em contrário, a escritura pública é essencial à validade dos negócios jurídicos que visem à constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis de valor superior a 30 vezes o maior salário mínimo vigente no país”.

Nas palavras da Rosa Maria de Andrade Nery e Nelson Nery Júnior (Instituições de Direito Civil: Volume 1 – Parte Geral do Código Civil e Direitos da Personalidade – SP, Thomson Reuters Brasil, 2019):

Para determinados atos, a lei exige forma especial, solene. Sendo essa a forma prescrita para o ato, ela se torna essencial para a existência e validade dele. Nesse caso, não é por “qualquer forma” que se realizam ou que se provam tais negócios.

Quando a lei material delimita a prova do ato à forma especial por ela imposta (como no caso do CC 108, ou seja, nos atos solenes), o ato, se não for assim celebrado, não tem o condão de produzir os efeitos pretendidos pelos contratantes.

Ou seja, a escritura pública é requisito essencial para a validade dos negócios jurídicos que visem à transferência de direitos reais sobre imóvel com valor superior a trinta vezes o salário-mínimo. Em outras palavras, será obrigatório a utilização de procuração pública na venda e compra de imóveis que ultrapassem o valor de trinta vezes o salário-mínimo.

De acordo com a relatora Ministra Maria Isabel Gallotti, no julgamento do AgInt no REsp 1894758 (2020/0151344-8 de 15/12/2021):

Assim, quando destinado à prática de negócio jurídico que vise à “constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis de valor superior a trinta vezes o maior salário-mínimo vigente no País” e, portanto, dependa da forma de escritura pública ( Código Civil, art. 108), o mandato deverá ser outorgado pela forma de instrumento público.

Se essa regra vale para os instrumentos de mandato em geral destinados à celebração de negócios jurídicos dependentes de escritura pública, os quais podem ser revogados ad nutum do outorgante, com maior razão ainda deverá ser seguida no caso de procuração em causa própria ( Código Civil, art. 685). Isso porque tal tipo de mandato é irrevogável, não se extingue pela morte de qualquer das partes, sendo isento o mandatário de prestar contas, podendo transferir para si os bens móveis ou imóveis objeto do mandato, obedecidas as formalidades legais.

II. 1 – Outorgantes estrangeiros

E a obrigatoriedade da procuração pública na transação imobiliária também deverá ser respeitada pelos Países que seguem o rito latino do notariado ( https://www.uinl.org/member-notariatscountry-map e https://snv-fsn.ch/)

Esse foi o entendimento da Segunda Vara de Registros Públicos do Estado de São Paulo, no processo de nº 1031413-39.2022.8.26.0100, que impediu a lavratura de uma Escritura Pública de Venda e Compra de Imóvel, perante o Tabelionato de Notas, com base em uma procuração particular dos vendedores suíços.

Caso tenha ficado alguma dúvida ou queira continuar conversando comigo sobre esse assunto, não deixe de me mandar um e-mail: draanacarolinabiasi@gmail.com ou contatar por meio do perfil do Instagram Ana Carolina Biasi

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